Quando o assunto é inovação, pode ser bem fácil se perder entre as dezenas de palavras terminadas em “tech”. No mercado de saúde então, esbarramos diariamente em healthtechs, medtechs, biotechs, deeptechs e até edtechs. Apesar de todos estarem de alguma forma próximos da tese de saúde, cada nicho faz isso de uma forma diferente.
Isso acontece porque condensar as necessidades do mercado de saúde em uma única categoria seria impossível. Ano após ano os desafios da Saúde não param de crescer. Consideremos que nesse setor, cada figura – como hospitais, operadoras, farmacêuticas, profissionais e pacientes – têm necessidades diferentes.
Assim, a fragmentação de termos ajuda a olhar cada segmento com maior atenção aos detalhes. Partindo desse princípio, podemos elencar que as principais dores de cada um seria, atualmente:
- Prestadores de serviço – necessitam de estratégias e recursos que permitam a diminuição do desperdício em saúde.
- Operadoras de saúde – buscam por abordagens e ferramentas para conter o número de fraudes;
- Farmacêuticas – focam no desenvolvimento de medicamentos e terapias assertivas;
- Paciente – procuram pelo que pode facilitar o acesso e melhorar o tratamento;
- Especialistas – precisam de ferramentas para diminuir a parte burocrática do trabalho, como prontuário eletrônico. A educação continuada também é promissora e pode ajudar o profissional a manter-se atualizado.
Portanto, vamos entender as semelhanças, diferenças e potencial de cada um ao longo do texto abaixo.
Healthtech
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o termo ‘health technology” pode ser usado para referenciar abordagens inovadoras em dispositivos médicos, substâncias e procedimentos (sejam eles médicos ou cirúrgicos). Dentro disso, o termo considera ainda que esses avanços podem ser utilizados para impulsionar a prevenção, o diagnóstico, tratamento e até reabilitação.
Consequentemente, sua versão mais curta, “healthtech”, é comumente utilizada para falar de tecnologias e soluções médicas baseadas em softwares, cujo objetivo é ajudar o público amplo a lidar com a saúde.
Em outras palavras, as healthtechs geram soluções para facilitar as atividades relacionadas à saúde em geral. A título de exemplo, vale considerar que essa classificação inclui plataformas de teleconsulta, dispositivos para rastreamento de sinais fisiológicos e aplicativos.
Potencial de mercado das Healthtechs
Na análise feita pela Grand View Research, o mercado de tecnologias de cuidado em saúde estava estimado em 663 bilhões de dólares em 2023. De 2024 até 2030, a expectativa é que continue crescendo cerca de 15.8% ao ano.
Entre os fatores que justificam tal expectativa, os pesquisadores citam o uso crescente de smartphones pelo mundo; demanda crescente por monitoramento da saúde fora de hospitais; infraestrutura tecnológica de saúde cada vez mais avançada; aumento no número de iniciativas e investimentos em soluções digitais de saúde.
Ainda em 2023, o Distrito mapeou 1023 startups com foco em saúde. Dessas, 26,44% tinham como soluções para a gestão de saúde. Em paralelo, soluções para facilitar o acesso à saúde correspondem a 12,46% das iniciativas e 11,96% à telemedicina.
No entanto, alguns gargalos ainda precisam ser enfrentados para o crescimento seguir sem grandes dificuldades. Entre eles, podemos citar:
- Integração e interoperabilidade – as soluções de healthtech precisam integrar-se de forma eficiente aos sistemas de saúde existentes, o que pode ser desafiador devido à variedade de plataformas e protocolos utilizados em diferentes instituições.
- Proteção de dados e privacidade – o aumento do uso de aplicativos e dispositivos de saúde, exige novos cuidados quanto à segurança e à privacidade dos dados dos pacientes. Com a criação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o descuido com tais questões pode gerar grandes prejuízos financeiros.
- Adesão e aceitação – alguns profissionais de saúde e pacientes podem ser resistentes à adoção de novas tecnologias. Isso porque, se de um lado existe a desconfiança, de outro vemos que a falta de preparo para lidar com tais recursos também contribui para esse tipo de resistência.
Medtech
Em paralelo, há o termo “medtech”. O diminutivo de “medical device” é usado para representar tecnologias médicas cujo propósito é otimizar diagnósticos e tratamentos. Entre os exemplos, é possível citar dispositivos endoscópicos, robôs para assistência cirúrgica e afins.
Potencial de mercado das medtechs
Enquanto isso, no ano passado, o mercado de medtech foi avaliado em cerca de 518 bilhões de dólares, segundo a análise da Fortune Business Insights. Para o ano atual, a expectativa é que esse valor alcance US$ 542 bilhões e para 2032, o valor esperado é de 886 bilhões de dólares. Dessa forma, o crescimento anual deste mercado seria de 6.3%.
Na perspectiva dos pesquisadores, um dos principais fatores a impulsionar esse mercado é o aumento da incidência de doenças crônicas – como as diabetes, obesidade e condições cardiovasculares. Entre outros cenários que também fomentam esse nicho, os analistas apontam para o aumento da população idosa no mundo; maior foco do mercado em medidas de prevenção contra doenças; melhora da segurança, qualidade e eficiência do ambiente regulatório.
Ainda segundo a análise da Fortune Business Insights, alguns segmentos de dispositivos crescem – e devem continuar crescendo – mais que outros. Veja na imagem abaixo:
Como o gráfico aponta, os dispositivos médicos de maior destaque em 2023 eram direcionados para o setor cirúrgico, diagnóstico in vitro, ortopédico, cardiovascular e diagnóstico por imagem.
Nesses casos, as medtechs surgem com soluções que facilitam o monitoramento dos sinais fisiológicos e ainda podem oferecer orientação personalizada para cada estágio do quadro clínico.
Em uma perspectiva geral, os analistas veem esse nicho como altamente fragmentado, já que possui empresas de portes variados liderando o meio. Entre elas, podemos citar a Medtronic, Johnson & Johnson Services, GE Healthcare, Stryker, Koninklijke Philips NV, Siemens Healthineers AG, BD, Cardinal Health.
Ademais, a América do Norte segue como líder, mas há expectativas consideráveis quanto ao crescimento anual das medtechs na América Latina, Oriente Médio e África.
Por outro lado, ainda existem desafios como as questões referentes à propriedade intelectual, a necessidade de investimento contínuo em pesquisa e desenvolvimento para manter a competitividade.
- Regulamentação – os dispositivos médicos estão sujeitos a normas e regulamentações rigorosas. Transitar por tais requisitos pode ser demorado e caro.
- Inovação contínua – o setor exige inovação constante para atender aos avanços na medicina e ao diverso perfil de pacientes, o que demanda investimentos substanciais em pesquisa e desenvolvimento.
- Custo e acessibilidade – o desenvolvimento de dispositivos médicos pode ser caro, e garantir que esses produtos sejam acessíveis para uma ampla gama de pacientes é um desafio significativo.
Deeptech
De acordo com o dicionário Cambridge, "deeptech" é um termo utilizado para falar negócios e/ou pesquisas baseadas em ciência e tecnologias avançadas. O termo engloba desde áreas mais abrangentes, como a biotecnologia, quanto soluções baseadas em inteligência artificial, blockchain, robótica, computação quântica e outros.
Ainda segundo o dicionário inglês, essa nomenclatura também é utilizada para falar de empresas – em especial, startups – cujo modelo de negócio é baseado em tecnologia de ponta, tendo como propósito a inovação e demais avanços científicos.
Potencial de mercado das deeptechs
Na visão dos especialistas da CB Insights, o segmento das deeptechs está crescendo rapidamente e deve alcançar o patamar de 700 bilhões de dólares até 2026. No entanto, existem desafios a serem superados. O principal deles é a complexidade técnica e a necessidade de investimento em pesquisa e desenvolvimento.
Nesse sentido, a complexidade das tecnologias deeptech – como a computação quântica e a inteligência artificial avançada – diz respeito a exigência de um alto grau de preparação técnica, o que pode dificultar a busca por profissionais qualificados e, consequentemente, aumentar os custos de mão de obra.
Por outro lado, fundir tecnologias muito disruptivas com abordagens seguras de negócio também costuma ser um gargalo. Em decorrência disso, as deeptechs sofrem com a falta de investimento em pesquisa, principalmente em fases clínicas. Por tratar-se de um modelo de negócios cujo resultado pode ser incerto e demorado, nem todo investidor gosta de abraçar o risco.
Apesar disso, as “tecnologias profundas” lidam com menos concorrência no início e causam as mudanças mais relevantes para a sociedade.
Biotech
Já a biotecnologia é uma subárea dentro de deeptech. O que caracteriza as biotechs como tal é o uso da biologia para resolver problemas e desenvolver produtos, conforme afirma a Encyclopædia Britannica. A enciclopédia reforça também que o setor de maior destaque da biotecnologia, é a engenharia genética, que atua no desenvolvimento de terapias e medicamentos.
Potencial de mercado das biotechs
No que se refere ao seu potencial de mercado, a Grand View Research colocou o nicho de biotecnologia na casa do 1 trilhão de dólares em 2023. Com a taxa de crescimento anual estimada em 13,96%, deve alcançar o patamar de US$ 3.88 trilhões até 2030.
Atualmente, as iniciativas em biotechs são favorecidas por mudanças regulatórias, aumento da demanda por tratamentos para doenças crônicas, aumento dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, avanço das tecnologias e maior incentivo governamental em geral.
Nesse segmento, é comum que as inovações contem com recursos de engenharia genética, edição de genes e demais técnicas avançadas. Ademais, entre os principais nomes dessa indústria, estão empresas como a AstraZeneca, Pfizer, Abbott, Sanofi, Biogen, Novartis AG, Gilead Sciences e La Roche.
Edtech
Já o termo “edtech” se refere a tecnologias aplicadas na educação. Ou seja, considera-se plataformas de aprendizado online, ferramentas de ensino interativo e softwares educacionais.
A rigor, talvez as edtechs não devessem estar nesta lista. No entanto, a educação médica é uma das grandes preocupações do setor de saúde. Nesse sentido, não se trata apenas de uma graduação de qualidade, mas de residências e educação continuada.
De acordo com uma reportagem publicada em 2022, naquele ano o Brasil viu a abertura de 173 novas graduações em medicina, alcançando o número de 353 instituições. Em 2024, esse número já se encontra no patamar de 384 – e nem estamos contando com os cursos que circulam mesmo sem autorização do MEC.
Ainda nessa questão, segundo o portal Resmedica, o Brasil tornou-se o segundo país com mais faculdades de medicina no mundo, ficando atrás somente da Índia. Esse cenário escancara duas problemáticas: a baixa qualidade de ensino fornecida em muitas dessas faculdades e o aumento da competitividade por vagas em cursos de residência.
Dessa forma, as edtechs com foco em saúde – como a Sanar, uma das investidas da Green Rock – surgem como uma ferramenta para ajudar estudantes a contornar essas dificuldades.
Potencial de mercado das edtechs
Em 2024, o relatório do Distrito, o Brasil é o país latino-americano que mais investe em startups de educação, chegando a concentrar 70% do total de edtechs, bem como 80% do volume de investimentos.
Para fins comparativos, vale considerar que o setor de edtech brasileiro movimentou cerca de 475 milhões de dólares entre 2015 e o primeiro trimestre de 2024. Enquanto isso, a movimentação dos países vizinhos varia de 2 milhões a 69,5 milhões de dólares.
Partindo da perspectiva mundial, o mercado de tecnologia educacional foi estimado em 142 bilhões de dólares em 2023. De 2024 até 2030, a expectativa é que tenha um crescimento de 13,4%.
No entanto, esse segmento ainda precisa vencer desafios associados à dificuldade de acessibilidade dessas tecnologias; manutenção da qualidade de ensino e integração com outros métodos de ensino.